Texto: João 19.23-27 Tema: Ganhando com a perda Introdução Jesus está na cruz. Completamente despido. Os soldados dividem sua roupa entre si. Era hábito dos judeus vestirem cinco peças de roupa. Uma na cabeça, estilo turbante; sandálias; uma túnica (que cobria, geralmente, todo o corpo, até os tornozelos e era usada por cima das outras peças); um cinturão (cinto ou faixa, que segurava a túnica junto ao corpo) e uma roupa de baixo. As quatro peças que os soldados dividiram entre si eram peças exteriores. Entretanto, o camisolão que ficou a sobrar, uma túnica confeccionada de material leve, que era preparada pela mãe enquanto o filho crescia. A de Jesus era sem costura. Este detalhe é muito importante porque esta declaração da túnica de Jesus combina com a túnica do sacerdote. Por que Jesus estava utilizar uma túnica de sacerdote? Antes de meditar na sua declaração que meditar sobre esta realidade. A resposta para esta pergunta é lógica e nós não atentamos para este facto na Bíblia. Jesus estava com esta túnica porque ele era de descendência sacerdotal. Sei que todos dirão que ele era descendente de David, portanto da tribo de Judá. É verdade, mas olhemos para Maria, a mãe do Senhor. Qual era a tribo de Maria? No evangelho de Lucas encontramos um casal muito interessante. Zacarias e Isabel. Ambos da linhagem sacerdotal. Isabel descendente de Arão (Lc 1.5). Lucas é minucioso. Ele diz que o anjo apareceu a Maria e anunciou que ela seria a mãe do Salvador. Maria não compreendeu esta visão logo de partida. Mas é bom notar o que o anjo diz a Maria na sequência do diálogo que eles têm: “Eis que também Isabel, tua parenta concebeu um filho em sua velhice; e é este o sexto mês para aquela que era chamada estéril; porque para Deus nada será impossível.” (Lc 1.36-37). Se elas são parentas, Maria é de linhagem sacerdotal. Portanto, Jesus é descendente de Arão. Ele é de linhagem sacerdotal. Ele é o nosso grande sumo sacerdote. Ele pode utilizar essa túnica (chiton), sem problema. É por este motivo que o autor de hebreus escreve: “Tendo, portanto, um grande sumo sacerdote, Jesus, Filho de Deus, que penetrou os céus, retenhamos firmemente a nossa confissão. Porque não temos um sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas; porém um que, como nós, em tudo foi tentado, mas sem pecado. Cheguemo-nos, pois, confiadamente ao trono da graça, para que recebamos misericórdia e achemos graça, a fim de sermos socorridos no momento oportuno. (Hb 4.14-16). Está ali o nosso sumo sacerdote despido. Pendurado na cruz, a ver que os soldados dividiam as suas roupas entre si. Quatro mulheres estão ali também reunidas. Elas sofrem por causa do sofrimento do seu Senhor. É no momento em que os soldados decidem lançar sorte sobre à sua camisola interior que Jesus olha para sua mãe. Foi neste momento que ele declarou-lhe: “Mulher, eis aí o teu filho” e depois disse ao discípulo: “eis aí a tua mãe”. Jesus conhecia bem Maria. Sabia o amor que ela tinha por ele. Sabia que aquele camisolão representava muita coisa. Demonstrava intimidade. E neste exacto momento que o Senhor ao olhar para tudo quanto Maria está a perder que lhe dá um novo direccionamento na vida. É no meio da sua dor e tragédia que ganha um novo filho. Jesus conhecia sua mãe. “É estranho o fato de muitos filhos não conhecerem a alma de seus pais, não penetrarem no mundo de suas emoções, não conseguirem perguntar a eles o que estão sentindo e do que necessitam. Conhecem a fachada, mas não sabem o que está por detrás dos seus olhos e dos seus gestos: suas lágrimas, seus sonhos, seus temores. Do mesmo modo, muitos pais não conseguem perceber que há um mundo a ser descoberto dentro de cada um de seus filhos, mesmo que eles os frustrem e tenham diversos defeitos. Pais e filhos precisam ser garimpeiros da alma. Precisam aprender a explorar um ao outro para descobrir as pedras preciosas que estão escondidas dentro deles.”[1] São estas pedras preciosas que queremos ver aqui nesta manhã. Vejamos portanto qual o significado desta declaração de Jesus. 1 – A vida só pode ser uma realidade concreta se encararmos à morte Deixe-me iniciar por uma realidade que nos foge à mente e que não é clara no texto. Jesus olha para sua mãe e mostra-lhe que foi para este momento que ele veio ao mundo. Lembra-lhe que ele deve cuidar dos negócios do seu Pai. Jesus mostra à sua mãe que apesar de amá-la profundamente, também amava o mundo e ela sabia bem quem ele era. Ela tinha consciência que seu filho querido era o Filho de Deus e que estava destinado a sofrer em nosso lugar. Ele veio pagar o preço pelos nossos pecados. É aquilo que Paulo escreveu em Romanos 6.23:” Porque o salário do pecado é a morte, mas o dom gratuito de Deus é a vida eterna em Cristo Jesus nosso Senhor.” A verdadeira vida só brota depois que a semente seca e brota. Jesus explicou isto muito bem: “Em verdade, em verdade vos digo: Se o grão de trigo caindo na terra não morrer, fica ele só; mas se morrer, dá muito fruto. “ (Jo 12.24). Para que a salvação fosse uma realidade para nós ele teria que suportar a cruz. Ele teria que morrer. Se Jesus tivesse desistido da cruz nós estaríamos perdidos. Jesus encarou a morte sem medo. Ele declarou: “Declarou-lhe Jesus: Eu sou a ressurreição e a vida; quem crê em mim, ainda que morra, viverá” (Jo 11.25). A vida reside nele. Ele tem todo o Poder. “Nós estamos psicoadaptados às palavras de Cristo, por isso não ficamos perturbados com elas. Os escribas e fariseus sabiam o que elas significavam, por isso ficaram profundamente perturbados.”[2] Eles reconheciam em Jesus alguém especial. Hoje olhamos para Jesus e não sabemos dizer quem ele é. É necessário repensar a nossa fé. É fundamental encararmos a morte para descobrirmos a vida. É este o significado das Palavras de Jesus: “Em seguida dizia a todos: Se alguém quer vir após mim, negue-se a si mesmo, tome cada dia a sua cruz, e siga-me. Pois quem quiser salvar a sua vida, perdê-la-á; mas quem perder a sua vida por amor de mim, esse a salvará. “ (Lc 9.23-24). Só há vida quando decidimos morrer para nós mesmos. Só há vida por causa da cruz e porque Jesus não desistiu do seu percurso. 2 – Quem perde um filho ganha uma nova realidade familiar Maria está a perder o seu filho amado. Ela sofre. Ao seu lado está João, discípulo amado. Alguém que sofre como ela. “Jesus sabia da dor de sua mãe. Seu coração claudicava, mas ele se mantinha lúcido. Então, olhou para ela e a viu chorando e profundamente angustiada. Não queria que ela sofresse. Mas era impossível aliviá-la. Diante disso, mais uma vez, reagiu de forma surpreendente. Ele se recosta novamente na cruz para respirar melhor. Sua dor se intensifica com essa manobra e solta sua voz, dizendo: “Mulher, eis aí o teu filho”.[3] Jesus tinha irmãos e irmãs (Mt 13.55-56). Contudo, o cuidado de sua mãe ele entrega a João. Ele como primogénito deveria determinar quem cuidaria de sua mãe. Jesus entrega sua mãe a alguém que tem a mesma visão que ele. Para Jesus a sua família é o grupo de pessoas que faz a vontade do Pai celestial. É o grupo de pessoas regeneradas. (Mt 12.47-50). Gosto muito da declaração de Isaltino sobre este aspecto: “Eu sei quem são meus irmãos e sei quem foi minha mãe mas a pergunta dele é esta quem são meus irmãos e quem é minha mãe, é o que ele está dizendo. Ele coloca os laços de fidelidade a Deus como mais fortes que os laços consangüíneos. A união dentro do propósito divino é maior do que a união de sangue, a cruz produz então uma nova família que é a família de Deus.”[4] E por este motivo que cantamos que somos uma família que vive o compromisso do grande amor de Cristo. Quem morre para si mesmo assumindo a cruz, ganha uma família. Jesus diz a Maria: Eis aí o teu filho. Mostra que os seus discípulos são uma família unida que enfrenta todas as situações juntas. Que sejamos este tipo de família. 3 – Quem perde um amigo, ganha a responsabilidade de cuidar do outro João estava a sofrer. Ele tinha deixado o Senhor no Jardim das Oliveiras. Fugiu, foi contar o que havia acontecido às mulheres. Estas fizeram com que ele as levasse ao pé do Senhor. Ali está João a sofrer. Ele está junto a cruz. Seu Mestre está nu pendurado à sua frente. Lágrimas correm pelo seu rosto. Jesus fala a sua mãe e em seguida diz a João: Eis aí a tua mãe. Jesus está a responsabilizar João. Ele diz que agora a vida de Maria está nas suas mãos. Naquele momento angustiante Jesus não desiste de sua mãe. Ele cuida dela. Diz a João: Eis aí tua mãe. Jesus diz que João é responsável pela vida de Maria. O texto declara que João assumiu esta responsabilidade. Podemos entender que: “Sua casa, seus pertences, sal família, seu mundo: tudo deveria incluir Maria dali em diante. Em outras palavras, tudo o que ele tinha tornou-se dela também.”[5] Hoje encontramos muita gente a desejar as bênçãos do Senhor, mas não o serviço. Jesus mostra que somos responsáveis uns pelos outros. É isto que diz a raposa no principezinho: “Ficas responsável para todo sempre por aquilo que cativaste.”[6] Igreja é um grupo de pessoas que deve viver solidariamente. Um grupo responsável um pelos outros porque nos cativamos. “Na igreja nós passamos a ter senso de responsabilidade uns pelo outros. A dor de um deve ser a dor de todos. Nós precisamos de gente que se compreenda como irmãos que deem as mãos, que se solidarizem. (…) Precisamos nos lembrar disto, a cruz cria novos laços familiares, a cruz cria novas fronteiras de responsabilidade, somos irmãos e somos responsáveis uns pelos outros. Um que esteja doente, um que esteja sofrendo, um que esteja desempregado, um que esteja com dor, é a dor, a doença e o sofrimento de toda a igreja.”[7] João via o seu Senhor na cruz. Ele não suportava aquele quadro. O Senhor diz: João és responsável por Maria minha mãe. Toma conta dela. Não a abandones. Conforta-a e ampara-a em todas as circunstâncias da vida. É esta a realidade que a igreja tem que viver. Na cruz, nós nos tornamos responsáveis uns pelos outros. Através da cruz nos tornamos igreja e podemos ajudar e ser ajudados. Guisa de Conclusão Jesus diz: “Mulher eis aí o teu filho”. “Filho eis aí a tua mãe”. A vida cristã tem que ser vida na sua totalidade. Muitas vezes temos que enfrentar as perdas. Mas mesmo nas perdas estamos a ganhar. É como o apóstolo Paulo afirmou: “E sabemos que todas as coisas concorrem para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito. Mas em todas estas coisas somos mais que vencedores, por aquele que nos amou.” (Rm 8.28; 37). Com Jesus sempre ganhamos. Que Deus nos abençoe! [1] CURY, Augusto Jorge. O Mestre do amor Academia da Inteligência, São Paulo, 2002. [2] CURY, Augusto Jorge. Análise da inteligência de Cristo: o Mestre dos Mestres, Academia de Inteligência, São Paulo 1999. [3] Op. Cit. [4] COELHO FILHO, Isaltino Gomes.A família nascida da cruz. www.ibcambui.org.br/mens21.html [5] SWINDOLL, Charles R. As trevas e o amanhecer: fortalecidos pela tragédia e triunfo da cruz, 1ª Edição, Editora Atos, Belo Horizonte MG, 2003 [6] EXUPÉRY. Antoine de Saint. O Principezinho 22ª Edição, EDITORIAL PRESENÇA, Lisboa 2003 [7] Op.Cit. |
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