Saneamento ambiental: desafio missionário urbano

Flávio Conrado
Marcus Vinícius Matos

Nos últimos anos, popularizou-se bastante o conceito de “desenvolvimento sustentável”como paradigma emergente que nos livrará da crise civilizacional atual. Normalmente, o relacionamos à necessidade de cuidar do meio ambiente. Entretanto, é importante compreendê-lo também em termos sociais e econômicos, como foi afirmado pela Conferência da ONU sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento -- a ECO-92 -- e reafirmado pela Declaração da Cúpula Mundial de Joanesburgo, em 2002.

O “saneamento” é um dos desafios que se relacionam com a noção holística de sustentabilidade e que refletem processos nos quais a combinação de ausência de políticas públicas e altos índices de desigualdade social produz impactos negativos sobre a saúde e o meio ambiente. Renomeado “saneamento ambiental”, o desafio se refere ao acesso à água encanada e potável, ao tratamento de esgoto sanitário, à coleta de lixo e ao tratamento de resíduos em aterros sanitários.

A situação do saneamento ambiental no Brasil é caótica e traz sérios riscos à população e à preservação do meio ambiente. Dados da ONU, do IBGE e da Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento alertam que, nas regiões urbanas do país, mais de 93 milhões de pessoas não têm esgoto tratado pelas redes públicas, cerca de 83 milhões não têm acesso a rede de esgotos sanitários adequados e 36% dos distritos abastecidos recebem água sem tratamento. Dados como esses deveriam nos estimular a considerar o saneamento ambiental como um dos principais desafios missionários nas cidades brasileiras.

Em resposta ao chamado bíblico de orar e procurar o bem-estar (“shalom”) da cidade (Jr 29.7), as igrejas poderiam começar a agir de forma prática de várias maneiras: 1) incluir o tema nos encontros de oração e nos currículos de suas escolas bíblicas; 2) criar equipes missionárias para identificar no bairro os domicílios não atendidos pelos serviços públicos de água, esgoto, lixo e tratamento de resíduos; 3) promover assembleias nas quais os gestores públicos sejam convidados a explicar a ausência de equidade e justiça; 4) colaborar com mutirões de limpeza de rios e lagoas; 5) implementar um programa de educação ambiental para conscientizar a população sobre o uso responsável da água e a importância da coleta seletiva.

A Rede FALE (www.fale.org.br) elegeu o saneamento ambiental como tema prioritário, nos últimos dois anos, para mobilizar a juventude evangélica a orar e atuar nos níveis local, estadual e nacional. Em 2009, a rede se mobiliza para transformar a realidade da comunidade de Grota Criminosa, na cidade de Marabá, PA. No cartão que promove a campanha, lê-se: “No município de Marabá, os serviços de saneamento não chegam à maioria das casas. Os rios são diariamente poluídos com lixo e esgoto. A população que vive em torno da Grota Criminosa é uma das que mais sofrem. Várias obras já foram realizadas no local. Contudo, a maior parte delas é feita de forma desordenada, sem consultar a população e sem compromisso com a restauração do meio ambiente. É preciso curar a Grota.”

É preciso curar as Grotas do Brasil. Já é tempo de as igrejas evangélicas despertarem para mais esse desafio missionário urbano.


Flávio Conrado é pesquisador do Instituto Superior de Estudos da Religião, membro da Rede Fale e pós-doutorando na Universidade de Montreal, no Canadá.

Marcus Vinícius Matos é secretário-executivo da Rede Fale e mestrando em teorias jurídicas contemporâneas na UFRJ.

Revista Ultimato

Edição 317
Março-Abril 2009